1.8.21

UM CONTO DE FADA VADIA

Era uma vez, numa terra distante, na verdade, a quarenta minutos de carro daqui, um jovem príncipe que estava voltando de sua caçada semanal de dvds. Ele estava descendo a rua Frei Caneca quando reparou num prédio mais adiante. Era uma sauna gay. Ele não gostava de sauna, mas curtia gays, resolveu entrar e matar o tempo. Lá dentro, ele esbarrou em muitos ogros e duendes, passou rapidinho por eles, e seus olhos encontraram um belo rapaz no fundo de um corredor. Todo atrapalhado com a toalha. Foi feito contato visual, nenhuma palavra foi necessária. E, dentro de uma cabine particular, seus corpos nus se uniram. Mais tarde, tomaram um banho juntos. Quando o jovem príncipe se preparava para ir embora, o belo rapaz o seguiu.

 

Os dois vestiram suas roupas e seguiram juntos pela calçada, conversando. O belo rapaz disse seu nome, e foi estranho. - Você sempre diz o seu nome completo? Perguntou o jovem príncipe. - Ah, ele respondeu, é que eu sou ator. O jovem príncipe, há tempos, estava procurando por uma alma gêmea, mas sabia que não a encontraria numa sauna gay, em um reino a quarenta minutos de carro, ou duas horas de trem. Ele disse para si mesmo: não se apaixone por essa pessoa. Eles caminharam bastante e conversaram bastante. O jovem príncipe se perguntava se o belo rapaz poderia ser visto na tv, ou no cinema, quem sabe um dia ele é indicado a um Oscar e me leva junt ... ok, pode parar. Não se apaixone, eu já disse.

 


Chegamos ... digo, eles chegaram num xópim center de tamanho médio que estava bem vazio naquela hora (ah, um xópim de motos com lojas de acessórios para motos, quantas pessoas frequentam o local por dia?). Eles fizeram sexo oral no banheiro do piso superior com muita privacidade (que descoberta, o jovem príncipe faria uso do local mais vezes no futuro). Saindo do xópim, mais um pouco de caminhada e bate papo. O belo rapaz gostava de olhar para o alto, para a arquitetura dos prédios. Aí, ele disse que estava fazendo uma peça - infantil - uma versão de Pinóquio - e ele era o Grilo Falante. Aquele Oscar agora ficou tão distante que nem o telescópio Hubble conseguiria ... ah, bem, isso explica a cabeça raspada. Como será o cabelo dele? Aposto que é lindo, pensou o jovem príncipe. O belo rapaz fez questão de seguir o príncipe até o terminal de ônibus, seria um adeus digno de Hollywood. Mas, no momento em que o jovem príncipe estava entrando no ônibus, o belo rapaz o puxou de volta e, pegando uma caneta emprestada com o motorista, escreveu seu telefone num pedaço de papel.


O que aquilo significava? Eles realmente iriam começar um namoro? Mesmo depois do belo rapaz ter dito que apenas teve uma ''tarde divertida com uma pessoal legal''? Ele mudou de ideia? No dia seguinte, o jovem príncipe tentou a sorte e ligou, a voz mágica no telefone disse que o número não existia (agora, aguenta coração, já que inventou essa paixão). O jovem príncipe repassou toda aquela tarde em sua cabeça para tentar entender o que ele fez de errado, o desfecho não fazia sentido. Então, ele procurou o espelho mágico, ao jogar o nome completo do belo rapaz no Google ... apenas uma imagem apareceu. Lá estava ele, ao lado do Gepeto, da Fada e do Pinóquio, pintado de verde, um verde bem sombrio, destacava muito o branco dos olhos e dos dentes, estava assustador. Não era um grilo, era um marciano de filme barato.

 

Cem anos se passaram (para os gays). O jovem príncipe encontrou um novo amor no extremo norte. Um rapaz que morava numa ilha bem quente, com uma cobra gigante no subterrâneo. Dizem que sua ilha vai afundar no mar no dia em que a tal cobra encontrar o próprio rabo. Os dois agora vivem juntos no sul gelado. O príncipe resolveu contar sua história com o Grilo Falante, e, enquanto escrevia, lhe ocorreu algo. Ele não entende muito bem de telefones, mas, será que, se ele tivesse colocado algum, tipo assim, prefixo na frente do número do Grilo ... ah, MERDA. Será que o pobre Grilo Falante passou o resto da semana, ao lado do telefone, esperando? Para o príncipe, restava apenas a lembrança do marciano assustador da fotografia. Quem diria, Marte está aqui ao lado, acho que o Hubble o encontraria no final das contas.
 

7 comentários:

Frazec (vulgo Jean-Philipe Rameau) disse...

Adorei o miniconto!
Tem revés, ao final, e humor.
Mostra o quanto esse príncipe contou a história em favor próprio. Afinal, para o enredo ter mais sabor (e o príncipe sustentar a narrativa), foi preciso um (des)encontro, não é mesmo?
;-)

Anônimo disse...

Eu AMO o jeito que você escreve, Alessandro.

Raul disse...

Humm… quantos detalhes picantes! Sobretudo a cobra gigante no subterrâneo…

Também tive uma dessas aventuras. Mas quando ele falou o número de telefone eu fingi que decorei. Não tinha certeza se ia dar certo. E ele eu conhecia de vista do Teatro, só que não tinha interpretado nada verde!

Raul disse...

Essa história foi escrita sob uso de algum psicotrópico?

Anônimo disse...

Alessandro, entenda: você precisa organizar esses contos e publicar.

t.

Jota Farr disse...

Que fofo, captei qual é a ilha "ao norte", muito amor pra vcs!

Anônimo disse...

Alessandro, na boa. Seus contos têm uma mistura de bom humor e erotismo sensacionais! Adorei esse, me diverti demais lendo e imaginando. Também apoio você publicar!