16.12.19

DOIS ATIVOS NÃO SE BICAM


Deixei o cinema e entrei numa farmácia que ficava ao lado. Acho que comprei um cortador de unhas, não me lembro bem. Me lembro do cara que me atendeu. Bonitão, quase trinta, eu acho. Quando fizemos contato visual, a coisa durou muito mais tempo do que era heterossexualmente permitido. O radar soltou um bip. Naquela noite, eu estava na cama dele.
E ele tinha alguma coisa escondida na calça. Quando ficamos nus, notei que não havia coisa alguma, tudo aquilo era ele mesmo. Enorme. Eu estava correndo o risco de ser linchado pela comunidade gay, aquilo não era um sonho de consumo, aquilo era preocupante. Eu deveria me preocupar com os meus órgãos internos? Ninguém quer ter um pulmão perfurado e morrer de hemorragia interna. 
Mas tudo bem, existe uma saída. Comecei a fazer os movimentos naturais e socialmente aceitos do macho ativo dominante (obrigado National Geographic). Mas o cara cortou a minha onda dizendo que é apenas ativo.

Lá estava eu, no mundo bizarro, tudo ao contrário. Muitos gays vivem dizendo que "Só existem dois tipos de gays, os passivos e os mentirosos", e eu vivia cercado por ativos (ou mentirosos). Eu não queria aquela coisa me machucando (mãe, pai, podem me levar pro hospital? Ah, como posso explicar?), então vou ser mentiroso também. Contei que eu era só ativo.
Para não perder a noite, transamos como duas lésbicas. No fim de semana seguinte, fui ao cinema com minha tia, uma prima, e minhas duas irmãs, pra ver a Pocahontas da Disney. Passei batido pela farmácia, mas ele com certeza me viu. Comprou um ingresso e entrou na sala. Era um cinema de rua, não tinha como errar, eu estaria na sala 1 ou na 2. Olhei para trás e o vi sentado no fundão. Ele fez um gesto me chamando. Eu disse para a minha família que eu iria ao banheiro e me sentei ao lado dele. Ele disse que gostou do nosso encontro (lésbicaaaa) e que queria me ver de novo. E aí foi embora.
Pocahontas perdeu dois homens e terminou o filme sozinha. Eu não queria terminar como ela, vamos para o sexo lésbico novamente. Depois do "sexo", ele me pediu em namoro.
Ah, a famosa lista de prioridades do meio gay. Primeira pergunta: Qual seu signo? (hoje mudou pra: qual seu uatiz?). Segunda pergunta: ativo ou passivo? Terceira: namora comigo? E quarta: qual é o seu nome?
Eu ia dizer meu nome, mas aí notei, pela primeira vez, a aliança no dedo dele.
- Sua esposa está viajando? perguntei.
- Não, ela está no hospital.
(Internada? Hemorragia interna?)
- Ela trabalha lá.
Ah, ok. 
- Eu sei o que você está pensando. A gente não deveria continuar com isso.
Na verdade eu estava pensando "Só a ponta talvez?", mas se ele quer terminar, tudo bem.

Cinco anos depois, eu passei na frente da farmácia. O cinema de rua já estava fechado há anos (maldito shopping). Eu o vi, seja lá qual for o seu nome, no balcão. Ainda bonitão. De algum lugar na rua, Christina Aguilera cantava "Meu corpo diz 'Vamos em frente', mas meu coração diz 'Não". Mundo bizarro de novo, tudo ao contrário pra mim.

7 comentários:

Neto Paes disse...

Transamos como duas lésbicas foi ótimo!!! Kkkkkk

Alessandro sempre a frente do seu tempo, inventando o Gouinage.

ALESSANDRO SKYWALKER disse...

Isso tem nome? sabia não. Joguei no google, valeu.

Anônimo disse...

Essa farmacia ainda existe? Kkk
É engracado ler suas historia e pensar que elas podem ter acontecido aqui em Jundiai. Cresci aqui e só fui saber que tinha gay aqui depois de muitos anos. Acho que eu qie sou atrasado kkkkk.

Thi disse...

Eita e teve um namorico depois que vc viu a aliança, correu ou só apimentou mais?
Nossa cinema de rua, eu nunca conheci uma que não fosse pornô, você é um viajante no tempo? rs

ALESSANDRO SKYWALKER disse...

Não precisa viajar muito no passado. Até a segunda metade dos anos 1990 ainda existia um cinema de rua na minha cidade.

ALESSANDRO SKYWALKER disse...

O cine Ipiranga ficava no calçadão, virou uma loja, acho que Riachuelo. A drogasil continua na mesma rua.

Anônimo disse...

experiência própria de quem já namorou um cara de três pernas: "devagarinho é que a gente chega lá", como diz Martinho da Vila.