A MENTIRA

Meu relacionamento com meu namorado do mal número 1 havia chegado ao fim depois de 5 anos e eu ainda estava de luto. Fazer o quê? Tinha essa sensação de ser o único homocara da cidade (e ela ainda não sumiu) então não tinha como ir atrás de um "namorado step" que me ajudasse a esquecer o anterior. E eu estava muito ocupado combatendo outra sensação, aquela que me diz que TODOS os homens do mundo são acessíveis, eu estava sem sexo há anos, então via possíveis parceiros de cama em todo canto.

E foi nessa época que o Chris Salvatore (não, não é o nome dele, não uso mais nomes reais aqui, mas a semelhança com o ator é grande) apareceu e me convidou para ir ao cinema. Eu já comecei a pensar em "segundas intenções" e em "sexo pós filme", mas tinha que me segurar.

A gente foi ver Independende day. Eu estava adorando o filme. Mas o Chris estava olhando para o outro lado. Duas garotas estavam de olho em nós. Em toda a minha inocência infantil, não reparei em nada, não costumo tirar os olhos da tela quando estou num cinema. Chris se levantou e foi bater um papo com as duas. Quando ele voltou, me disse - vamos embora daqui.

Chris e as garotas tinham um plano. Deixar o cinema e ir até um clube qualquer.

Só podia ser brincadeira, esse filme vai levar um ano ou dois para ser lançado em video, eu quero vê-lo agora. Podemos esperar pelo término do filme para discutir o assunto? Aparentemente não, as duas já estavam deixando a sala.  Agarrei minha poltrona com força. Eu não queria sair dali.

- Qual é o problema? Ele perguntou - Parece que não gosta de mulher.

- Eu? Que bobagem, é claro que eu gosto.

Ele me puxou para perto e me perguntou se eu havia trazido grana. Nós, os homens, vamos pagar a entrada das moças, elas gostam desse tipo de coisa. Eu já havia perdido o meu filme, estava profundamente irritado, e agora deveria abrir minha carteira para uma desconhecida. 

- Com qual das duas você quer ficar? - ele perguntou.

Com você?

- Isso não vai dar certo, estou com pouca grana no bolso.
- Temos que arrumar alguma coisa agora. Por favor, Alessandro, pense em alguma coisa.

- Você tem aquele seu amigo que trabalha aqui no xópim, pede uns trocados emprestados para ele.

Ok, perdi meu filme e vou ficar endividado? Existe um lugar aqui perto, que seja alto o suficiente, para eu gritar "eu sou gay"?

Pegamos o dinheiro, entramos no carro e... nada de clube. O plano agora era dar uns amassos nas meninas dentro do carro.

A acompanhante do Chris queria ir ao banheiro e ele a levou de volta para o xópim. E lá estava eu, esperando para ser apunhalado pelo Freddy Krueger, no banco de trás de um carro, com uma humana fêmea. Começamos a conversar, legal, pelo menos ela era tímida. Depois de alguns minutos, ela soltou o cabelo. Se os filmes já me ensinaram alguma coisa... isso não era um bom sinal. 

Ok, tá na hora do velho esqueminha, eu digo que não gosto de mulheres, ela fica assustada ou nervosa, ela conta para a amiga, a amiga conta pro Chris e ele deixa de ser meu amigo. Vou ter sorte se ele me levar de volta para casa em seguida, mas acho que não vai me deixar entrar no carro.

- Acho que preciso ir ao banheiro também - eu disse.

- Eu vou com você.

- NÃO, não, não precisa, alguém tem que ficar aqui no carro, hã, os dois já devem estar voltando.

Um plano de fuga? Nenhum. Passei pelo cinema e tive uma ideia. Hey, tenho grana no bolso, comprei um ingresso para a sessão seguinte de Independence day e esperei lá dentro. Depois do filme, com medo de passar pelo estacionamento, atravessei o viaduto e peguei um ônibus.

Encontrei o Chris na frente da minha casa, pensando num modo de contar para a minha mãe que eu havia sido sequestrado. Ele queria que eu me explicasse. 

A coisa me veio de repente:

- Ah, você me deixou sozinho com a mais feia das duas (que maldade, não era feia não). 

- Você achou ela feia? Ela ficou preocupada com você. E, para o caso de eu te encontrar, ela me deu o telefone dela. Toma, pega.

Olhando para a esquerda, olhando para a direita.

- Sabe? Eu gosto de homens...

Típico, sem dizer uma única palavra, ele se virou, entrou no carro e eu nunca mais o vi. Ai ai, e eu ainda teria mais 5 anos de seca pela frente. Mas aprendi a ficar de boca fechada.