29.2.12

PRECISAMOS DE UM BARCO MAIOR

O sr Robinson não tirava os olhos de mim, eu não tirava os olhos da Aletéia. E ela não tirava os olhos do Robinson júnior. Nesse momento, o céu despencou. Uma tempestade monstruosa começou a cair. Muitas pessoas, que passavam pela rua, entraram na locadora para se proteger da chuva. De repente, havia uma multidão lá dentro. O pessoal começou a passear pelo local, uma vez que agora estavam todos presos ali.
Eu tentava olhar por cima do mar de cabeças, estava procurando pela cabeça loira, com mechas azuis, da Aletéia. Consegui ver sua vassoura mata-criança passando pelo meio das cabeças. Como se fosse a barbatana do tubarão no filme. A barbatana subia e descia, cada vez que desaparecia eu ficava preocupado. Um trovão anunciou o desastre, a sra Robinson entrou na locadora.
- Cansei de esperar por vocês dois no carro.
Gordinha, baixinha, irada. Era a sargento Megera em carne e osso. Estava dando uma bronca no marido, que baixava suas orelhas.
Júnior apareceu logo em seguida.
- Mãe, ela me bateu com a vassoura. Disse ele apontando.
- Você bateu no meu filho?
Téia estava sorridente.
- Sim senhora, ele estava dentro da seção reservada, ele é um safado.
É claro que a sargento Megera só ouviu aquilo que queria ouvir.
E lá vamos nós:
- Sua menina grossa, mal educada (e muitos outros nomes feios) onde já se viu?
Se ela chamar a Aletéia de estrupícia, eu não vou conseguir segurar uma risada.
- Vou fazer você ser despedida.
- Rá, meu pai é o dono dessa merda. Ele nunca vai me despedir.
Filha do dono, sempre funciona. Todo mundo acredita.
- Vamos embora, nunca mais volto aqui.
Ela pegou o filho e o marido e saiu na chuva. O sr Robinson me lançou um último olhar, triste.
Eu fiquei com vontade de matar a Aletéia, o que fazer? O patrão precisa saber o que ela anda aprontando por aqui. O mundo precisa saber. Eu poderia criar um blog e... não, espera, isso ainda não existe. Esqueça a Aletéia, não foi culpa dela. Pense, pense.
E se eu fosse atrás do sr Robinson??
Veja a ficha dele, talvez haja um endereço. Sim, tem sim. Campo Limpo Paulista??? Aquele fim de mundo?? Naquela época, o mundo para mim ainda era grande e assustador.
Como vou encontrar esse endereço? Eu poderia usar o google e... não, espera, isso ainda não existe, argh, como eu odeio viver no passado.
De repente, uma luz, um número de telefone. Eu poderia ligar para a casa do sr Robinson e marcar um encontro.
No dia seguinte, disquei o tal número. A sargento Megera atendeu, desliguei na cara dela. De repente, medo. E se ela tiver um daqueles identificadores de chamadas? Onde? No passado e no fim do mundo? Que bobagem.
Mas o telefone da locadora começou a tocar no mesmo instante. Era ela, só podia ser ela. O que eu vou dizer? Seu marido me ama, por favor caia morta? Meus joelhos começaram a tremer. Olhei para os lados e vi a Aletéia num canto do balcão. Ela estava desenhando um crânio na madeira com o canivete.
- Téia, eu disse docemente, você poderia atender o telefone?
- Claro.
E ela pegou o telefone e disse "alô?"

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